Artigo

Inteligência Artificial e Jurisprudência Preditiva: Ferramenta ou Armadilha?

Ciro Barbosa dos Santos
Advogado Tributarista

Resumo
A Inteligência Artificial (IA) tem provocado impactos crescentes no meio jurídico,
especialmente com a expansão da jurisprudência preditiva. Este artigo examina o
potencial transformador dessa tecnologia, destacando que ela pode ser uma aliada
poderosa — ou uma armadilha perigosa — dependendo da forma como for utilizada. A
adoção consciente e crítica, com constante verificação e uso responsável, é essencial
para garantir que a IA sirva à Justiça, e não o contrário.
1. Introdução
A informatização do Judiciário foi apenas o início. Agora, com o uso de ferramentas
baseadas em IA, os operadores do Direito lidam com uma nova fronteira: a análise
preditiva de decisões judiciais. O impacto é potencialmente revolucionário, pois envolve
desde estratégias processuais até a redefinição de riscos em litígios empresariais.
2. O que é a jurisprudência preditiva?
A jurisprudência preditiva é uma aplicação de algoritmos — especialmente de
aprendizado de máquina (machine learning) — que analisa grandes volumes de decisões
judiciais e aponta tendências estatísticas de julgamento.
3. A IA como aliada: vantagens práticas
Se usada com critério, a IA pode ser uma excelente aliada:
? Otimização do tempo na análise de precedentes;
? Maior previsibilidade jurídica para empresas e clientes;
? Auxílio na precificação de honorários de êxito e provisões contábeis;
? Mapeamento de posicionamentos jurisprudenciais por tema, relator ou tribunal.

4. O risco da confiança cega: a IA como armadilha
No entanto, a IA também se engana. Ela depende de dados passados, e pode reproduzir
injustiças históricas, vieses e distorções estatísticas. Entre os riscos, destacam-se:
? Falsa neutralidade: algoritmos também carregam vieses (raciais, sociais,
regionais).
? Exclusão de nuances: a máquina não capta contextos humanos, culturais ou
provas orais.
? Transparência limitada: nem sempre é possível saber “por que” a IA chegou a
determinada conclusão.
? Desumanização do Direito: decisões podem ser tratadas como mera estatística,
em prejuízo da justiça material.
5. A importância da consciência crítica e da verificação dupla
A IA deve ampliar a capacidade de análise, e não substituir o raciocínio jurídico. Assim
como o advogado verifica uma fonte doutrinária ou um julgado, também deve conferir
as bases e a lógica dos resultados algorítmicos. Isso exige:
? Conhecimento técnico básico da ferramenta usada;
? Ceticismo construtivo: questionar os resultados apresentados;
? Consulta cruzada com doutrina, jurisprudência recente e provas concretas do
caso.
6. Perspectiva regulatória e ética
O uso da IA no Direito precisa ser regulamentado com responsabilidade. O projeto do
Marco Legal da Inteligência Artificial (PL 2.338/2023) propõe princípios como:
? Supervisão humana contínua;
? Proibição de discriminação algorítmica;
? Responsabilidade por danos;
? Garantia de explicabilidade.
7. Considerações finais
A jurisprudência preditiva não deve substituir o raciocínio jurídico, mas sim ampliar as
ferramentas de análise estratégica disponíveis aos advogados e juízes. É essencial que
sua adoção ocorra com transparência, supervisão humana e respeito aos direitos
fundamentais, garantindo que a tecnologia seja uma aliada — e não uma ameaça — à
justiça.
A missão do jurista, portanto, é dominar a tecnologia, mas manter a mente vigilante.
A IA pode ajudar a alcançar justiça — desde que seja colocada a seu serviço, e não
no lugar dela.