OPINIÃO

O advogado de fora do TRF-4 não entra 

Por Lino de Carvalho Cavalcante – Advogado

A Resolução Administrativa nº 388/2024 do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) introduziu nova barreira ao acesso de advogados aos processos judiciais, limitando a consulta aos autos eletrônicos àqueles que estejam formalmente constituídos nos feitos. Apesar da justificativa de proteção de dados, a medida impacta frontalmente direitos e garantias fundamentais da advocacia e da cidadania, como a publicidade dos atos processuais e o livre exercício profissional.

Publicidade como regra constitucional

A Constituição estabelece, no artigo 5º, inciso LX, que os atos processuais são públicos, salvo nos casos em que a lei determine o sigilo. O Código de Processo Civil, por sua vez, reafirma esse princípio em seu artigo 11, fixando que o segredo de justiça constitui exceção e depende de previsão expressa, como previsto no artigo 189 do CPC. A publicidade assegura o controle social da atividade jurisdicional e protege o Estado democrático de Direito.

Prerrogativas da advocacia e violação institucional

Nos termos do artigo 7º, inciso XIII, da Lei nº 8.906/94, é prerrogativa do advogado examinar processos públicos, findos ou em andamento, mesmo sem procuração. Ao condicionar o acesso à constituição nos autos, o TRF-4 afronta essa prerrogativa, interferindo na liberdade de atuação dos profissionais, sobretudo em diligências, consultas técnicas e no exercício da fiscalização institucional.

Efeitos sobre o jurisdicionado e fragmentação do sistema

A medida não impacta apenas a advocacia, mas também o cidadão, que pode desejar substituir seu advogado ou obter segunda opinião técnica. Ao não permitir que advogados não constituídos tenham acesso ao processo, o jurisdicionado se vê privado de liberdade plena de escolha. Além disso, abre-se perigoso precedente de fragmentação da unidade do sistema de justiça, podendo ser replicado por outros tribunais com critérios assimétricos.

Reserva de mercado e violação à isonomia entre advogados

A Resolução nº 388/2024 do TRF-4, ao restringir o acesso aos autos eletrônicos a advogados formalmente constituídos, cria na prática uma reserva de mercado em favor de profissionais com atuação nos estados sob sua jurisdição direta: Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Essa limitação territorializa indevidamente o exercício da advocacia, contrariando os princípios da isonomia, da liberdade profissional (artigo 5º, XIII da Constituição) e da atuação nacional da advocacia prevista no Estatuto da OAB.

O advogado regularmente inscrito na Ordem deve poder exercer sua atividade em qualquer ponto do território nacional. Ao impor exigência de prévia constituição para acessar autos públicos, o TRF-4 prejudica os profissionais que atuam fora da Região Sul, gerando desequilíbrio concorrencial e restringindo, por consequência, o direito do cidadão de escolher livremente seu defensor com base em critérios técnicos, e não geográficos.

Trata-se de uma distorção incompatível com o modelo federativo e com os fundamentos do Estado democrático de direito, demandando imediata correção institucional.

Considerações finais

A Resolução nº 388/2024 deve ser revista por extrapolar os limites legais e comprometer garantias fundamentais. O equilíbrio entre proteção de dados e acesso à Justiça deve respeitar a legalidade, a publicidade e a ampla defesa. A atuação da OAB, do CNJ e de outras entidades institucionais é essencial para a correção do ato e preservação das prerrogativas da advocacia em todo o território nacional.

*Lino de Carvalho Cavalcante é presidente da Comissão de Precatórios da OAB/DF.

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