Aspectos jurídicos da saúde digital. Conheça os principais desafios da telemedicina
Por Thaynara Andretta*
A telemedicina revolucionou o acesso aos cuidados de saúde, permitindo que os pacientes sejam atendidos remotamente através do uso de tecnologias de comunicação. Embora essa experiência já exista no Brasil desde o início da década de 90*, este tipo de atendimento recebeu um impulso substancial durante a pandemia da Covid-19, uma vez que a necessidade de consulta médica à distância se tornou implacável devido às restrições à circulação. No entanto, à medida que a saúde digital continua a desenvolver-se, surgem novos desafios jurídicos complexos, especialmente no que diz respeito à proteção dos dados dos pacientes.
É importante esclarecer que a telemedicina abrange não apenas a consulta médica de forma virtual, mas também a teleinterconsulta, o telediagnóstico, a telecirurgia, o telemonitoramento, a teletriagem e a teleconsultoria. Por este motivo, foi necessário que o Conselho Federal de Medicina (CFM) estabelecesse uma nova regulamentação, em maio de 2022, através da Resolução nº 2.314/2022, definindo em seu artigo 5º as várias modalidades de telemedicina**.
A realização de procedimentos médicos de forma remota oferece numerosos benefícios, incluindo maior acessibilidade ao atendimento, redução de custos e conveniência tanto para pacientes quanto para profissionais de saúde. Contudo, o atendimento à distância depende do uso intensivo de dados e da transmissão de informações sensíveis, o que levanta preocupações legais e éticas significativas, já que o Brasil promulgou a nova Lei Geral de Proteção de Dados*** (Lei nº 13.709/2018), regulamentando o tema no país sobre o tratamento de dados pessoais. A lei tem como objetivo proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
Principais desafios
Nessa esteira, as instituições de saúde e os médicos enfrentam um ambiente regulatório complexo ao implementar soluções de telemedicina e precisam estar cientes de alguns desafios, observando-os atentamente com a finalidade de se manterem alinhados à legislação. Abaixo podemos exemplificar os principais desafios:
As instituições de saúde e médicos precisam realizar previamente uma consultoria com profissional especialista na área para que possa atuar em conformidade com Regulamentações de Privacidade de Dados e estar de acordo Leis, como o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR)**** na União Europeia e a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) no Brasil. Estas estabelecem padrões rigorosos para o processamento e a proteção de dados pessoais, incluindo dados de saúde. Garantir a integridade e segurança dos dados dos pacientes tanto durante a transmissão quanto durante o armazenamento, sendo este um desafio técnico e legal, já que quaisquer violações de dados podem trazer consequências legais gravíssimas. Informar aos pacientes para que estes compreendam como seus dados serão usados, armazenados e compartilhados na telemedicina. Obter consentimento de uso esclarecido, deixando claro tratar-se não apenas de uma boa prática médica, mas também de uma exigência legal. Atentar-se que a telemedicina pode envolver a prestação de serviços através das fronteiras nacionais, o que levanta questões sobre qual legislação de proteção de dados se aplica. Garantir que a emissão de receitas médicas e atestados em consultas remotas sejam assinados com certificação ICP-Brasil ou que atendam aos demais requisitos estabelecidos na legislação para que tenham validade. As instituições devem garantir que os serviços de telemedicina atendam ou superem os padrões de atendimento presencial, o que inclui garantir a precisão do diagnóstico e a eficácia do tratamento. Medidas proativas
Diagnosticados e mapeados os riscos e definidas as estratégias para Proteção de Dados, as instituições da área da saúde e os médicos poderão superar facilmente os desafios, adotando medidas proativas como:
Realizar avaliações regulares de risco para identificar e mitigar potenciais vulnerabilidades de segurança de dados. Estabelecer políticas internas efetivas sobre segurança da informação baseadas nos critérios da integridade, confidencialidade, disponibilidade e segurança jurídica, abrangendo todas as pessoas que tenham acesso aos dados da empresa ou de seus usuários/consumidores. Treinar os colaboradores, conscientizando-os sobre as melhores práticas de proteção de dados e garantindo que compreendam as regulamentações aplicáveis. Realizar auditoria e monitoramento dos processos sistemáticos que garantam a eficácia dos controles internos para a certificação de que há atuação em conformidade com as regulamentações, bem como identificar possíveis vulnerabilidades e riscos associados à proteção de dados. Desenvolver e comunicar políticas de privacidade claras para pacientes, incluindo informações sobre como os dados são coletados, usados e protegidos. Implementar soluções tecnológicas avançadas, como criptografia de dados e autenticação de dois fatores, e qualquer outro recurso de segurança para proteger as informações dos pacientes. E não menos importante, contratar fornecedores de plataformas de tecnologia que compreendam as complexidades do setor de saúde e possam fornecer soluções dentro das exigências legais. A telemedicina representa um avanço promissor na prestação de cuidados de saúde, mas também exige uma abordagem cuidadosa em relação à proteção de dados do paciente. As instituições de saúde e os médicos devem navegar cuidadosamente no ambiente regulatório, adotando práticas robustas de proteção de dados para construir confiança e evitar repercussões legais. Ao enfrentar esses desafios legais com diligência, a telemedicina pode continuar a crescer de forma segura, oferecendo cuidados inovadores e acessíveis para todos.
Diante dessas considerações, fica evidente a importância de uma abordagem cautelosa e responsável na implementação da telemedicina, visando assegurar a proteção dos dados dos pacientes e o cumprimento das regulamentações em vigor.
*Thaynara Andretta é advogada no escritório Rucker Curi – Advocacia e Consultoria Jurídica, especialista em Direito Contratual e membro da Comissão de Processo Civil da OAB-PR.
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