Fiscalização das pesquisas eleitorais pelos partidos
Djalma Pinto*
As pesquisas interferem no processo eleitoral, na cotação do dólar, na bolsa de valores, no ânimo da militância, dos doadores de campanha etc. Embora, em ano eleitoral, haja obrigatoriedade do seu registro, a Justiça Eleitoral não realiza qualquer controle prévio sobre os resultados que são divulgados ao público, sendo os dados levados a registro de exclusiva responsabilidade das empresas pesquisadoras. (Art. 2º, § 5º e art.10, § 1ºda Res/TSE nº 23.600/2019). Partidos, candidatos, coligações e federações de partidos podem, porém, fiscalizar ou auditar as pesquisas publicadas.
Na disputa para presidente, o pedido de acesso aos dados com base nos quais as empresas elaboraram as suas pesquisas, inclusive, às planilhas, mapas ou equivalentes, deve ser feito perante o TSE. No caso de eleição estadual, o requerimento deve ser direcionado ao respectivo TRE. No dia seguinte, após a divulgação da pesquisa, exige a legislação que o seu registro seja complementado com os dados relativos aos municípios, bairros ou área de sua realização.
A não complementação do registro com essas informações, no prazo estipulado, acarreta a tipificação da pesquisa como não registrada, sujeita ao pagamento de multa de cinquenta mil a cem mil Ufir, nos termos do art. 2º, parag. 7º, da Res. 23.600/2019 c/c art. 33, § 3º, da Lei 9504/97.
A única pesquisa em que os eleitores podem aferir a sua exatidão é aquela divulgada na véspera e no dia da eleição. A singularidade, nesse caso, é que os seus números podem ser confrontados com aqueles divulgados pela Justiça Eleitoral, após a apuração de todas as urnas. Estará ela correta quando a votação, nela especificada, dos respectivos candidatos se situa dentro da margem de erro estabelecida pela empresa que a realizou.
O comprometimento da normalidade do processo eleitoral ocorre, porém, quando, por exemplo, a pesquisa, com uma margem de erro de 3%, feita na véspera do pleito com ampla divulgação no dia da eleição, apresenta um candidato com 25% (vinte e cinco pontos percentuais) na frente do seu adversário. Abertas as urnas, constata-se que a diferença entre eles fora, na verdade, de apenas 2% (dois pontos percentuais).
Essa pesquisa induziu os eleitores indecisos em erro. Comprometeu a normalidade do processo eleitoral. A alegação de que o eleitor muda de ideia, até na hora de teclar na urna, motivou a criação pela ciência do erro estatístico, da margem de erro que quantifica esse erro, “indicando a precisão de sua estimativa”. Essa “álea” situa-se no campo da volatilidade, das oscilações, da probabilidade também igualmente presente nas pesquisas corretas. Para não responder pelos danos causados aos candidatos prejudicados pelo erro, cabe à empresa responsável pela sua realização apontar o fato bizarro, inusitado, ocorrido após a coleta das suas amostras, que motivou tamanha discrepância entre os números divulgados ao público e o resultado da votação apresentado pela Justiça Eleitoral. A propósito, um vídeo do candidato, apontado com 25% na frente do seu concorrente, agredindo uma mulher, após a coleta das amostras, pode explicar o desacerto da pesquisa. Todavia, sem uma explicação convincente, o dever de reparar os danos se impõe.
Por envolver oscilações, probabilidade e aleatoriedade, a ciência estatística se socorre da “margem de erro” para considerar correta a pesquisa em que o resultado oscile, dentro dos parâmetros preestabelecidos pelo. Assim, é tida como correta a pesquisa eleitoral cujo número de votos atribuídos aos candidatos se encontre dentro da margem de erro nela fixada. A lei não contém palavras inúteis. Se o legislador obriga que toda pesquisa eleitoral indique a sua margem de erro é, justamente, para que a cidadania tenha parâmetro para aferir o seu acerto e, quando for o caso, a sua inexatidão. Afinal, por mais perfeita que seja a metodologia nela utilizada, estará sujeita ao “erro estatístico”:
Quando você usa estatísticas para estimar um valor, é importante lembrar-se de que não importa quão bem seu estudo foi projetado, sua estimativa está sujeita a erros de amostragem aleatórios. A margem de erro quantifica esse erro e indica a precisão da sua estimativa.
Ao declarar a inconstitucionalidade do art. 35-A da Lei 9504/97, que proibia a divulgação de pesquisa nos 15 dias anteriores à eleição, o STF, na ADI 3741-2, deixou enfatizada a responsabilidade civil pelos danos materiais e morais causados por pesquisas erradas, como uma das “restrições admissíveis ao direito à informação”. Empresas de pesquisas exercem atividade de risco. Por determinação do art. 927, § único do Código Civil, sua responsabilidade é objetiva pelos danos causados por seus erros. Eleição limpa, justa e transparente é, afinal, incompatível com pesquisa acintosamente incorreta, que induz em erro os eleitores, comprometendo a normalidade da disputa.
*Autor de diversos livros entre os quais Pesquisas Eleitorais e a impressão do voto.