Os desafios da mulher advogada na sociedade brasileira contemporânea
Por Juliana Daher Delfino Tesolino *
A advocacia é uma profissão historicamente dominada por homens, refletindo as desigualdades estruturais que permeiam o mercado de trabalho no Brasil. Embora as mulheres já sejam maioria nos cursos de Direito e em exames da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), elas ainda enfrentam barreiras significativas para alcançar equidade no exercício da advocacia. Essas dificuldades vão desde preconceitos velados e desigualdades salariais até assédios e a conciliação entre a carreira e as demandas familiares.
A advocacia brasileira tem testemunhado, nas últimas décadas, uma crescente participação feminina. Contudo, as mulheres advogadas ainda enfrentam uma série de desafios relacionados ao preconceito de gênero, desigualdade de oportunidades e falta de reconhecimento. Embora representem mais da metade dos registros na OAB, sua presença em posições de liderança e em áreas tradicionalmente mais valorizadas do Direito permanece limitada.
Essa realidade é ressaltada por mulheres que se tornaram ícones na luta por igualdade dentro da profissão. Em suas trajetórias, destacam não apenas os obstáculos enfrentados, mas também as transformações necessárias para construir um mercado jurídico mais justo e inclusivo.
De acordo com dados do Conselho Federal da OAB, em 2023, mais de 50% dos advogados registrados no Brasil eram mulheres. Essa conquista, entretanto, esconde desafios profundos. No topo da pirâmide, em posições de liderança como sócias em grandes escritórios ou em cargos de destaque na administração pública, a presença feminina ainda é minoritária.
Segundo um estudo da Associação Brasileira de Jurimetria (ABJ), apenas 30% das mulheres advogadas ocupam posições de chefia em escritórios de advocacia, mesmo possuindo currículos equivalentes ou superiores aos de seus colegas homens. Essa discrepância é fruto de barreiras invisíveis que limitam o avanço profissional feminino, conhecidas como “teto de vidro”.
Uma das barreiras mais difíceis de superar são os preconceitos de gênero que permeiam a advocacia. Mulheres ainda precisam provar continuamente sua competência em ambientes dominados por homens. Em audiências, por exemplo, não é raro que advogadas sejam interrompidas, subestimadas ou tratadas de forma condescendente por juízes, promotores ou até mesmo colegas de profissão. Além disso, a pesquisa “Violência contra a Mulher Advogada”, realizada pela Comissão da Mulher Advogada da OAB-SP, revelou que mais de 70% das advogadas entrevistadas já sofreram algum tipo de assédio ou desrespeito no exercício da profissão.
Esses episódios incluem comentários sexistas, invasões de espaço pessoal e até ameaças veladas em negociações ou audiências. É notório que a violência de gênero na advocacia é um reflexo das desigualdades estruturais da sociedade brasileira sendo urgente a implementação de políticas de enfrentamento que garantam um ambiente de trabalho seguro e respeitoso. Outro desafio enfrentado pelas advogadas no Brasil é a desigualdade salarial. Em média, mulheres na advocacia recebem salários 20% menores que os de homens na mesma posição, segundo um levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).
Essa diferença é ainda maior em escritórios de grande porte, onde bônus e promoções frequentemente favorecem profissionais masculinos. Além disso, mulheres advogadas relatam ser preteridas em casos de maior relevância ou complexidade jurídica. Áreas tradicionalmente mais lucrativas, como Direito Tributário e Empresarial, tendem a ser dominadas por homens, enquanto mulheres são frequentemente direcionadas para áreas percebidas como “menos estratégicas”, como Direito de Família ou Consumidor. A dupla jornada, que combina trabalho formal com responsabilidades familiares, é outro obstáculo para as mulheres na advocacia.
A falta de políticas públicas e de suporte institucional para equilibrar vida profissional e pessoal contribui para que muitas advogadas abandonem suas carreiras ou limitem suas ambições. Segundo uma pesquisa do IBGE, mulheres brasileiras dedicam, em média, 21 horas semanais ao trabalho doméstico, enquanto os homens dedicam apenas 11 horas. Essa desigualdade sobrecarrega as advogadas, tornando mais difícil participar de eventos, viagens e demandas de alta intensidade que são comuns na profissão. Apesar dos desafios, movimentos dentro e fora da advocacia têm buscado transformar esse cenário.
A OAB Nacional, por meio da Comissão Nacional da Mulher Advogada, tem promovido debates e políticas para ampliar a igualdade de gênero. Em 2021, a OAB aprovou a paridade de gênero nas chapas para eleição da instituição, garantindo que mulheres ocupem ao menos 50% das vagas. Além disso, escritórios progressistas têm implementado programas de mentoria, flexibilização de horários e iniciativas para combater o preconceito de gênero, servindo como exemplo para o restante do mercado jurídico. Nesse contexto, fica claro que ser mulher advogada na sociedade brasileira atual é um exercício diário de resiliência e luta.
As conquistas alcançadas ao longo das últimas décadas são inegáveis, mas os desafios permanecem significativos. A promoção da igualdade de gênero no Direito não é apenas uma questão de justiça, mas também de eficiência: escritórios e instituições que valorizam a diversidade apresentam melhores resultados e maior credibilidade. Com a ampliação de políticas de paridade, enfrentamento ao assédio, apoio à maternidade e incentivo ao empreendedorismo, a advocacia brasileira pode se tornar mais inclusiva e representativa, abrindo espaço para que mulheres conquistem plenamente seu lugar de direito.
Portanto, para que as advogadas alcancem seu pleno potencial, é essencial que o mercado jurídico continue a combater preconceitos, assédios e desigualdades, garantindo que todas as profissionais tenham acesso às mesmas oportunidades e respeito. Afinal, como disse Ruth Bader Ginsburg, ícone da luta pela igualdade no Direito: “As mulheres pertencem a todos os lugares onde as decisões estão sendo tomadas”.
*O conteúdo do artigo assinado não representa necessariamente a opinião do Mackenzie.
Fonte – Agência Race de Comunicação
Faça seu comentário!